Com mais de 350 anos, o serviço postal brasileiro é um elemento indispensável para a integração do território nacional, sendo os Correios a única instituição cuja capilaridade atinge todos os municípios, cumprindo o princípio de universalidade presente na Constituição de 1988. Com essa característica, é possível oferecer a todos os lugares não somente o serviço de cartas, telegramas e encomendas, mas também a logística de comércio eletrônico e a execução uma série de políticas públicas.
Essas políticas são as mais diversas: desde a saúde, com a distribuição de vacinas e materiais para os postos de saúde do SUS, até a educação, com a entrega de livros didáticos e dos exames nacionais como o Enem, que ocorrem simultaneamente em todos os municípios onde a prova é aplicada.
Agora, com as eleições, o serviço postal é fundamental para o envio de todo o material necessário, em alguns casos as próprias urnas eletrônicas. Em 2021, o sucesso de uma campanha de vacinação em massa contra a Covid-19 dependerá em grande medida da estrutura logística dos Correios para alcançar desde as grandes metrópoles às cidades ribeirinhas da Amazônia, em tempo recorde.
O comércio eletrônico, por sua vez, é o responsável por uma atualização do serviço postal, que não desapareceu com o advento da internet como postulavam as teses mais conservadoras na virada do século, pelo contrário: o fluxo postal aumentou em 50% entre os anos de 2000 e 2010. Conforme o e-commerce brasileiro se consolida na pandemia, mais uma vez o setor postal se torna essencial e lucrativo.
Por isso mesmo, outra vez ressurge a proposta de privatização dos Correios, sem o necessário debate que envolve a complexa questão. Quando empresas como Amazon, FedEx e DHL anunciam interesse na compra da estatal, um sinal amarelo se acende: a entrega de um serviço estratégico a uma empresa estrangeira, especialmente quando algumas delas estão envolvidas nos mais polêmicos casos recentes de uso indevido de dados dos consumidores, parece não ser a via mais inteligente.
Se o controle do correio é entregue a corporações que atuam unicamente nas regiões mais lucrativas, deixando muitas cidades desassistidas, como aconteceu na vizinha Argentina, seguramente as empresas de e-commerce também serão atingidas, porque não poderão vender para todo o país.
Enfrentar o isolamento social, que já não se sabe quando terminará, e a posterior campanha de vacinação em massa exigirá um serviço que conecte todos os lugares. Abrir mão da integração do território nacional conquistada a duras penas em mais de três séculos não parece ser a estratégia de um país que adentra o século XXI aspirando qualquer lugar digno no mapa mundi da economia – e da cidadania. A soberania nacional também parece estar ameaçada, já que nem mesmo as nações mais liberais como os EUA venderam suas empresas estatais de correio.
É hora de retomar os princípios constitucionais como norteadores do desenvolvimento nacional. Aqui ganham tanto as empresas quanto os cidadãos dos povoados mais longínquos. Perder o que nunca tivemos – a vacina – até podemos compreender. Agora perder o que já temos de melhor – a capacidade de distribuí-la com eficácia – resulta em ação inapropriada, sobretudo se lembramos que os Correios são uma empresa que custeia sua operação com o próprio lucro, que está no azul e tende a crescer no pós-pandemia, não dependendo de impostos ou repasses do Tesouro.
POR:Igor Venceslau
Doutorando em Geografia Humana/USP.
igorvenceslau@usp.br
FONTE:
https://monitormercantil.com.br/a-importancia-dos-correios-no-pos-pandemia